CONTRIBUIÇÃO DO LEITOR

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Recebi do professor Francisco Borges (Francisquinho) um e-mail que tanto ele como eu consideramos oportuno publicar neste modesto blog.

Abaixo envio uma cópia da carta escrita por uma professora, que trabalha no Colégio Estadual Mesquita, à revista Veja. Esta carta é uma resposta a uma reportagem em que a jornalista defende a ideia de que as aulas sejam cronometradas a fim de medir o tempo que o professor fica em sala de aula e o tempo em que "efetivamente está dando aula". Peço, por favor, que a repassem. Vale a pena ler.


RESPOSTA À REVISTA VEJA


Sou professora do Estado do Paraná e fiquei indignada com a reportagem da jornalista Roberta de Abreu Lima “Aula Cronometrada”. É com grande pesar que vejo quão distante estão seus argumentos sobre as causas do mau desempenho escolar com as VERDADEIRAS razões que geram este panorama desalentador.

Não há necessidade de cronômetros, nem de especialistas  para diagnosticar as falhas da educação. Há necessidade de todos os que pensam que: “os professores é que são incapazes de atrair a atenção de alunos repletos de estímulos e inseridos na era digital” entrem numa sala de aula e observem a realidade brasileira. Que alunos são esses “repletos de estímulos” que muitas vezes não têm o que comer em suas casas quanto mais inseridos na era digital? Em que  pais de famílias oriundas da pobreza  trabalham tanto que não têm como acompanhar os filhos  em suas atividades escolares, e pior em orientá-los para a vida? Isso sem falar nas famílias impregnadas pelas drogas e destruídas pela ignorância e violência, causas essas que infelizmente são trazidas para dentro da maioria das escolas brasileiras. Está na hora dos professores se rebelarem contra as acusações que lhes são impostas. Problemas da sociedade deverão ser resolvidos pela sociedade e não somente pela escola.

Não gosto de comparar épocas, mas quando penso na minha infância, onde pai e mãe, tios e avós estavam presentes e onde era inadmissível faltar com o respeito aos mais velhos, quanto mais aos professores e não cumprir as obrigações fossem escolares ou simplesmente caseiras, faço comparações com os alunos de hoje “repletos de estímulos”. Estímulos de quê?  De passar o dia na rua, não fazer as tarefas, ficar em frente ao computador, alguns até altas horas da noite, (quando o têm), brincando no Orkut, ou o que é ainda pior envolvidos nas drogas. Sem disciplina seguem perdidos na vida. Realmente, nada está bom. Porque o que essas crianças e jovens procuram é amor, atenção, orientação e disciplina.

Rememorando, o que tínhamos nós, os mais velhos, há uns anos atrás de estímulos? Simplesmente: responsabilidade, esperança, alegria. Esperança que se estudássemos teríamos uma profissão, seríamos realizados na vida. Hoje os jovens constatam que se venderem drogas vão ganhar mais. Para quê o estudo? Por que numa época com tantos estímulos não vemos olhos brilhantes nos jovens? Quem, dos mais velhos, não lembra a emoção de somente brincar com os amigos,  de ir aos piqueniques, subir em árvores? E, nas aulas, havia respeito, amor pela pátria.. Cantávamos o hino nacional diariamente, tínhamos aulas “chatas” só na lousa e sabíamos ler, escrever e fazer contas com fluência. Se não soubéssemos não iríamos para a 5ª. Série. Precisávamos passar pelo terrível, mas eficiente, exame de admissão. E tínhamos motivação para isso.

Hoje, professores “incapazes” dão aulas na lousa, levam filmes, trabalham com tecnologia, trazem livros de literatura juvenil para leitura em sala-de-aula (o que às vezes resulta em uma revolução), levam alunos à biblioteca e a outros locais educativos (benza, Deus, só os mais corajosos!) e, algumas escolas públicas onde a renda dos pais comporta, até a passeios interessantes, planejados minuciosamente, como ir ao Beto Carrero. E, mesmo, assim, a indisciplina está presente, nada está bom. Além disso, esses mesmos professores “incapazes”,  elaboram atividades escolares como provas, planejamentos, correções nos fins-de-semana, tudo sem remuneração.

Todos os profissionais têm direito a um intervalo que não é cronometrado quando estão cansados.. Professores têm 10 minutos de intervalo, quando têm de escolher entre ir ao banheiro ou tomar às pressas o cafezinho. Todos os profissionais têm direito ao vale alimentação, professor tem que se sujeitar a um lanchinho, pago do próprio bolso, mesmo que trabalhe 40 h.semanais. E a saúde? É a única profissão que conheço que embora apresente atestado médico tem que repor as aulas. Plano de saúde? Não temos, ou seja não existe.    Há de se pensar, então, que  são bem remunerados... Mera ilusão! Por isso, cada vez vemos menos profissionais nessa área, só permanecem os que realmente gostam de ensinar, os que estão aposentando-se e estão perplexos com as mudanças havidas no ensino nos últimos tempos e os que aguardam uma chance de “cair fora”.Todos devem ter vocação para Madre Teresa de Calcutá, porque por mais que  esforcem-se em ministrar boas aulas, ainda ouvem alunos chamá-los de “vaca”, “gordos “, “velhos” entre outras coisas. Como isso é motivante e temos ainda que ter forças para motivar. Mas, ainda não é tão grave. Temos notícias, dia-a-dia,  até de agressões a professores por alunos. Futuramente, esses mesmos alunos, talvez agridam seus pais e familiares.

Lembro de um artigo lido, na revista Veja, de Cláudio de Moura Castro, que dizia que um país sucumbe quando o grau de incivilidade de seus cidadãos ultrapassa um certo limite. E acho que esse grau já ultrapassou. Chega de passar alunos que não merecem. Assim, nunca vão saber porque devem estudar e comportar-se na sala de aula; se passam sem estudar mesmo, diante de tantas chances, e com indisciplina... E isso é um crime! Vão passando série após série, e não sabem escrever nem fazer contas simples. Depois a sociedade os exclui, porque não passa a mão na cabeça. Ela é cruel e eles já são adultos.
Por que os alunos do Japão estudam? Por que há cronômetros? Os professores são mais capacitados? Talvez, mas o mais importante É QUE HÁ DISCIPLINA. E é isso que precisamos e não de cronômetros.  Lembrando: o professor estadual só percorre sua íngreme carreira mediante cursos, capacitações que são realizadas, preferencialmente aos sábados. Portanto, a grande maioria dos professores está constantemente estudando e aprimorando-se.

Em vez de cronômetros, precisamos de carteiras escolares, livros, materiais, quadras-esportivas cobertas (um luxo para a grande maioria de nossas escolas), e de lousas, sim, em melhores condições e em maior quantidade. Existem muitos colégios nesse Brasil afora que nem cadeiras possuem para os alunos sentarem. E é essa a nossa realidade!  E, precisamos, também, urgentemente de educação para que tudo que for fornecido ao aluno não seja destruído por ele mesmo.

Em plena era digital, os professores ainda são obrigados a preencher os tais livros de chamada, à mão: sem erros, nem borrões  (ô, coisa arcaica!), e ainda assim se ouve falar em cronômetros. Francamente!!!

Passou da hora de todos abrirem os olhos e fazerem algo para evitar uma calamidade no país, futuramente. Os professores não são culpados de uma sociedade incivilizada e de banditismo, e finalmente, se os professores  até agora  não responderam a todas as acusações de serem despreparados e  “incapazes” de prender a atenção do aluno com aulas motivadoras é porque não tiveram TEMPO. Responder a essa reportagem custou-me metade do meu domingo, e duas turmas sem as provas corrigidas.

NOTA DO BLOG: o texto acima foi publicado da forma como o recebi. Não fiz nele nenhuma correção gramatical. 

7 comentários:

Anônimo disse...

Um desabafo desse dói dentro de gente, como a gente, que teve a oportunidade de ainda aproveitar um pouco da época em que era bom ir para a escola aprender lições de vida e sociabilidade.
(Urraca).

Anônimo disse...

A professora está correta quando destaca que os professores não são culpados dos problemas sociais, que são refletidos no cotidiano da escola. Mas, penso que ainda poucos são os profissionais em educação que, verdadeiramente, se preocupam com a realidade de exclusão escolar de seus alunos. Muitos possuem um belo discurso, se dizem conhecedores dos problemas educacionais, entretanto, não agem para modificar a realidade. Entendo que não será com a escola recheada de recursos modernos que mudaremos a realidade educacional brasileira.
A solução passa, necessariamente, pelo comprometimento do professor em sua prática educativa, pelo não conformismo com a realidade de crianças que chegam ao 6º ano do Ensino Fundamental, sem saber ler e, que logo de cara, recebem a sentença de condenados ao fracasso escolar; passa pela reconstrução de valores na família quanto à valorização da formação escolar, bem como pela discussão social em torno da escola que queremos e, a que é possível ter, dentro da realidade que nos é apresentada.
Se todos os envolvidos no processo educativo, refletissem sobre suas posturas, ações e valores e, agissem em prol do sucesso de cada aluno em particular, seria mais fácil chegarmos à solução das problemáticas educacionais. São nossas ações que modificam o mundo e não nosso discurso. O que temos feito para modificar nossa particular realidade?

Graças Silva disse...

Boa noite!

Alcimar gostei muito do relato, só acredito que não se faz necessário os professores fazerem leitura desse tipo, pois isso já é a nossa realidade. Texto como esse deve ser enviado para os nossos representantes quem sabe nas férias do meio do ano eles tirem um tempinho para se deleitarem, já que os professores não direito a esse previlégio.

Graças Silva.

Francisco Borges disse...

O anônimo que escreveu o 2º comentário, critica os professores acusandou-os de discurso vazio, mas no final do texto propõe ações e menos discurso, ai eu pergunto: E você o que tem feito pelos nossos educandos?

Anônimo disse...

Caro, Francisco Borges
Quando coloquei o questionamento sobre o que temos feito para modificar nossa particular realidade, não me excluo do contexto. Destaquei que a modificação da realidade requer reflexão e mudança de postura tanto de educadores, quanto pais e da própria sociedade.
Mas, fazendo uma análise da minha prática educativa, posso lhe indicar alguns caminhos que tenho seguido:
1º Sempre considerei todos os meus alunos como seres potencialmente inteligentes, busco conhecer o histórico-cultural de cada um deles, tenho uma relação, extremamente, dialógica, amigável e próxima aos alunos, o que me faz ser facilmente aceita;
2º Tenho um profundo sentimento de pertencimento a escola a qual faço parte. Não costumo fazer críticas vazias. Quando me utilizo de críticas já proponho sugestões para melhorias;
3º Leio bastante sobre as problemáticas educacionais, me atualizo, tento relacionar teoria a prática, testo teorias, etc.

Penso que agindo nessa direção estou no caminho certo. Posso não fazer a diferença, mas procuro oferecer o meu melhor. Um abraço!

Francisco Borges disse...

Caro anônimo acima, desejo muito conhecê-lo, para isso é necessário que você se identifique.

Anônimo disse...

Prefiro não me identificar. Meus colegas de trabalho,alunos e pessoas do meu convívio, sabem do meu comprometimento com a educação.
Você já me conhece,mas talvez nunca tenha reparado em mim. Um abraço!

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