DEU NA REVISTA VEJA

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O artigo abaixo transcrito, de autoria de J. R. Guzzo, foi publicado na revista Veja, edição do último dia 8 de junho. Recomendo sua leitura.

O ministro não conta

Entre os sinais que marcam um país como subdesenvolvido, ninguém mais discute, há muito tempo, que o baixo nível da educação está na linha de frente. Não dá para disfarçar; é uma ferida bem no meio da testa. Há muitas outras marcas desse tipo, claro, todas visíveis quando se presta um mínimo de atenção à paisagem pública, e nenhuma delas está em falta no Brasil que se pode ver à nossa volta. São coisas muito simples. Todo país subdesenvolvido, por exemplo, tem mosca; não há exceções. Os aeroportos, em vez de terem à sua volta hotéis operados pelas grandes cadeias internacionais, são cercados por favelas. Homicidas confessos podem começar o cumprimento de suas penas onze anos após o crime que cometeram, quando não são “cidadãos comuns”. É uma estrada que vai longe. A cada realidade dessas, é como se uma placa de sinalização avisasse: “Atenção: você está num país subdesenvolvido”. Não adianta, aí, ter um PIB que passa dos 2 trilhões de dólares, assistir ao lançamento de imóveis com preços de Manhattan ou anotar o que diz a máquina de propagada do governo. O atraso continua do mesmo tamanho, indiferente a tudo isso – e não vai mudar, por mais que se avance aqui ou ali, enquanto esses sinais estiverem presentes. Não vai mudar, para começo de conversa, enquanto a educação pública no Brasil for o que é hoje.

Ela é o que se sabe. Nos oito anos e meio da atual gerência, a educação brasileira continuou solidamente estagnada na sua situação de calamidade, entre as piores do mundo a cada pesquisa que sai. Os professores não sabem ensinar, os diretores não sabem dirigir e os alunos não conseguem aprender. Os burocratas do Ministério da Educação, é claro, jogam em cima do cidadão e da mídia uma apavorante massa de números e estatísticas, o tempo todo, para mostrar quanto progredimos; dez minutos depois ninguém se lembra de mais nada do que disseram, e a realidade não se altera. Não, nem de longe, no ritmo que seria indispensável para dar condições mínimas de competição ao aluno da escola pública – e diminuir a desvantagem que o separa, em termos de conhecimento, de quem pôde estudar nas boas escolas do sistema privado. Numa situação dessas, a população brasileira – que vai acabar pagando perto de 1,5 trilhão de reais em impostos até o fim do ano – teria o direito de esperar que o MEC estivesse trabalhando dia e noite para tirar nossas escolas do terceiro ou do quarto mundo em que vivem. Mas não é o que acontece. É verdade que o MEC, ultimamente, não sai do noticiário, o que pode dar, até, uma impressão de grande operosidade. O problema é que não aparece por estar cumprindo melhor a sua obrigação, que é ensinar. Aparece porque deu para produzir episódios cada vez mais esquisitos, um depois do outro. Nenhum deles tem qualquer coisa a ver com o ensino da regra de três ou com a Batalha de Tuiuti. Todos têm a ver, apenas, com o deslumbramento dos atuais burocratas do ministério em dar à educação brasileira uma abordagem “popular”, “democrática”, “moderna”, “avançada” ou de “esquerda” – ou tudo isso junto.

As autoridades que mandam hoje no ensino público nacional estão convencidas de que a função principal do MEC não é transmitir conhecimento, mas colocar a sociedade brasileira no molde político e ideológico que elas consideram ideal para o país. Em vez de ensinar, acham que a prioridade do ministério é combater o racismo, resolver o problema da distribuição de renda ou promover a “diversidade” de preferências sexuais. Acreditam que os alunos têm de receber instrução politicamente “correta” e que devem ser treinados para admirar as realizações do governo. Querem, inclusive, transformar o português numa língua “democrática” e livre de regras criadas pela elite. O primeiro resultado disso é a sequência de disparates que o MEC tem criado nos últimos tempos. Vai-se, aí, da condenação por “racismo” da Tia Nastácia, de Monteiro Lobato, ao “kit” de incentivo à homossexualidade, uma ideia tão ruim que o próprio governo desistiu de levar a coisa adiante. Ou, então, da inépcia na organização dos exames do Enem à licença para escrever “nós vai pescar”. O segundo resultado é que, com todas essas preocupações, não sobra tempo para ensinar o que é o ângulo reto.

Como um país pode ser desenvolvido se a grande maioria da sua população não aprende o que precisa? O ministro da Educação talvez saiba a resposta – mas, se souber, não está contando para ninguém.

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