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quarta-feira, 15 de junho de 2011


A crase não foi feita pra humilhar ninguém



Vou a piscina? Vou à piscina? Ele se dirigiu a Maria? Ele se dirigiu à Maria? Fui a Brasília? Fui à Brasília? Parece pegadinha. Mas não é. Trata-se da crase. Ferreira Gullar disse que o acentinho não foi feito pra humilhar ninguém. Pode ser. Mas que dá nó nos miolos, isso dá. Você sabe desatá-lo? Antes de responder, faça o teste. Assinale com V, de verdadeiro, as frases nota mil. E com F, de falso, as notas zero. Depois, escolha a sequência pra lá de certa:

( ) Vou à piscina da Água Mineral. 
( ) 
João Marcelo é fiel à namorada. 
( ) 
Relativamente à questão proposta, nada posso informar( ) Paulo se dirigiu a diretora da escola em que estuda.

a. V, V, V, F
b. F, F, F, V
c. F, F, V, V
d. F, F, V, F

E daí?

Marcou a letra a? Pra lá de certo. O acentinho grave não lhe vai roubar nenhum pontinho no vestibular, no trabalho, no concurso ou na vida. Preferiu outra letra? Bobeira total. Deixe a preguiça pra lá e parta pra luta. Você não merece ser maltratado por um grampinho à toa. Vá em frente.

Sem humilhação

O acentinho grave só tem uma função na língua portuguesa. É indicar a crase. Mas, apesar da exclusividade, muitos tropeçam nele. A razão é simples. Poucos lhe conhecem a manha. Mas não há bem que sempre dure nem mal que nunca se acabe. No instante em que dominam os três passos do sinalzinho, acertam todas. Quer ver?

Primeiro passo: desvendar o segredo do grampinho 
Crase é como aliança no dedo esquerdo. Avisa que estamos diante de ilustre senhora casada. A preposição a se encontra com o artigo a. Os dois se olham. Sorriem um para o outro. O coração estremece. Aí, não dá outra. Juntam os trapinhos e viram um único ser. 
Segundo passo: descobrir se existem dois aa 

Para que a duplinha tenha vez, impõem-se duas condições. Uma: estar diante de uma palavra feminina. A outra: estar diante de um verbo, adjetivo ou advérbio que peçam apreposição a

Vou à piscina da Água Mineral. 
O verbo ir pede a preposição a (quem vai vai a algum lugar). 
O substantivo piscina adora o artigo (a piscina da Água Mineral fica na Asa Norte). 
Resultado: a + a = à 

João Marcelo é fiel à namorada. 
O adjetivo fiel reclama a preposição a (quem é fiel é fiel a alguém). 
Namorada se usa com artigo (a namorada de Marcelo se chama Carla). 
Resultado: a + a = à 

Relativamente à questão proposta, nada posso informar. 
O advérbio relativamente exige a preposição a (relativamente a alguém ou a alguma coisa). 
Questão pede o artigo a (a questão ainda não tem resposta) 
Resultado: a + a = à 
Terceiro passo: recorrer ao macete 
Não quebre a cabeça. Na dúvida, recorra ao tira-teima. Substitua a palavra feminina por uma masculina. (Não precisa ser sinônima.) Se no troca-troca der ao, não duvide. É crase na certa: 

Vou à piscina. Vou ao clube. 
Rafael é fiel à namorada. Carla é fiel ao namorado. 
Relativamente à questão, nada posso fazer. Relativamente ao problema, nada posso fazer.
 
Moral da história: Ferreira Gullar tem razão. A crase não foi feita pra humilhar ninguém. Mas para indicar o encontro de dois aa. Só.

Teste

Está pra lá de certa a frase:

a. Quanto à carta citada no artigo de hoje, espera-se que tenha muita repercussão.
b. Quanto a carta escrita pela presidente, espera-se que tenha muita repercussão.

Acertou?

Escolheu a letra a? Acertou. Na dúvida, vamos ao troca-troca: Quanto ao poema citado no artigo de hoje. Espera-se que tenha muita repercussão.

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