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sexta-feira, 19 de agosto de 2011


O BOM PORTUGUÊS DE UMA BOA SEGUNDA FASE DA OAB


No último dia 17, foi realizado o IV Exame Unificado da Ordem dos Advogados do Brasil, de incumbência da Fundação Getúlio Vargas (FGV Projetos). Os aprovados serão submetidos a uma segunda prova, de cunho dissertativo, no dia 21 do corrente mês - a chamada "segunda fase da OAB".

Em minhas aulas de língua portuguesa, voltadas para o preparo do aluno para esta etapa, venho chamando a atenção quanto à necessidade de se construir o texto jurídico com correção gramatical e clareza, além dos demais atributos que marcam a boa linguagem - elementos que serão aferidos no processo de correção das provas.

O presente artigo traz importantes dicas àqueles que irão enfrentar esta iminente fase escrita:

DICA 1: de início, frise-se que a FGV já adota em seus textos de prova as regras do Acordo Ortográfico. Diante desse quadro, temos recomendado aos candidatos que se tomem as devidas cautelas quanto à ortografia e acentuação daqueles vocábulos que sofreram alteração, conquanto saibamos que permanece a facultatividade das regras até 31 de dezembro de 2012. A título de exemplo, a Banca Examinadora evidenciou sua preocupação com as novas regras em várias palavras inseridas no caderno de prova da primeira fase. Observe-as:

a) Grafia do vocábulo COAUTOR (questão 66): sabe-se que todas as palavras com o prefixo co- perderam o hífen, devendo-se escrever codemandado, codenunciado, coautora, copiloto, entre outros vocábulos. Portanto, evite o hífen nessas palavras, se quiser escrever em consonância com a nova ortografia. A Banca já deu indícios de sua predileção...;

b) A queda do acento gráfico no ditongo aberto das paroxítonas - ASSEMBLEIA, sem acento (questão 51): as palavras cuja sílaba tônica é a penúltima são classificadas como paroxítonas (caráter e cadeira, por exemplo). Se nesta sílaba ocorrer a presença de um ditongo aberto (éi, éu e ói), cairá o acento gráfico da sílaba que o abriga. Assim, à luz das novas diretrizes de acentuação impostas pelo Acordo, deveremos escrever ideia (e não mais "idéia", com acento), paranoia (e não mais "paranóia", com acento), eu apoio (e não mais "eu apóio", com acento). Assim, a FGV andou bem quando evidenciou tal atualização e zelo em seu texto - aliás, todo ele muito bem escrito -, preferindo a forma assembleia (sem acento) à acentuada palavra "assembléia";

c) A queda do acento diferencial na expressão "polo ativo" (questão 44): com o Acordo, alguns acentos diferenciais desapareceram. Assim, não mais se faz necessário distinguir para (preposição) e para (verbo, antes com acento agudo); pelo (preposição) e pelo (substantivo, antes com acento circunflexo); e, entre outros casos, o citado polo (substantivo, antes com acento agudo) e polo (substantivo, antes com acento circunflexo). É que, antes do Acordo, escreviam-se "pólo ativo" para designar a extremidade, "pólo aquático", para a modalidade esportiva, além do pouco conhecido "pôlo", para indicar uma espécie de falcão. Com a mudança, este acento diferencial desapareceu, restando apenas polo para todos os casos. Portanto, na seara jurídica, para indicar a extremidade ou o lado, prefira polo ativo, sem acento - você vai ficar do lado certo: o da Banca Examinadora;

d) A despedida do trema: como é cediço, o trema caiu. A FGV indicou em várias passagens da prova da primeira fase a sua preocupação com o conhecimento da regra. Em tempos de prova dissertativa, vale a pena prestarmos atenção ao dado. Note as situações em que o acento foi bem retirado do texto do caderno de provas:

1. consequência (questão 36);

2. liquidação (questão 40);

3. consequente presunção (questão 44);

4. "arguida, por escrito" e "a arguição de falsidade" (questão 67);

5. "a arguição de suspeição" e "se for arguida a suspeição" (questão 68);

6. liquidação (questão 78).

Superada a questão do Acordo Ortográfico, passemos a outras dicas que serão úteis na elaboração da peça e das questões dissertativas, que comporão a prova de segunda fase:


DICA 2: SUPRACITADO e SUPRAMENCIONADO

Trata-se de palavras que repudiam o hífen. O prefixo supra- apenas virá com esse sinalzinho se a palavra posterior iniciar-se por -h ou idêntica vogal (supra-histórico e supra-atmosférico);


DICA 3: BOA-FÉ e MÁ-FÉ

Os substantivos compostos boa-fé e má-fé são hifenizados. Tais palavras transitam em abundância no dia a dia do operador do Direito.

Procure deixar evidente e legível na prova dissertativa - até porque a prova é manuscrita - que você bem conhece o hífen em ambas, não abrindo mão dele... A propósito, a FGV utilizou tais palavras em duas questões da primeira fase (12 e 46), sempre com o hífen, é claro.



DICA 4: EVITE O INEXISTENTE "NO QUE PERTINE..."

É comum no vocabulário jurídico o uso de expressões inexistentes, algumas delas até com boa sonoridade e um toque - duvidoso - de erudição. É o caso da expressão "no que pertine..." ("No que pertine ao art. __, entende-se que o instituto jurídico é válido."). Sabe-se que inexiste em nosso léxico o verbo "pertinir", devendo-se o operador do Direito optar por expressões legítimas e mais apropriadas, tais como: no que tange a, no que se refere a, no tocante a, no que concerne a, no concernente a, entre outras. Assim, procedendo-se à correção da forma supracitada:

- No que tange ao art. __, entende-se que o instituto jurídico é válido. Ou:

- No que se refere ao art. __, entende-se que o instituto jurídico é válido. Ou:

- No tocante ao art. __, entende-se que o instituto jurídico é válido. Ou, ainda:

- No que concerne ao art. __, entende-se que o instituto jurídico é válido.

Aliás, no caderno de primeira fase, a Banca houve por bem ao utilizar a expressão no concernente ao tema (questão 8) e no tocante às normas (questão 26).


DICA 5: CUIDADO COM O "ANTE AO EXPOSTO, (...)"

A preposição ante não pode vir acompanhada de outra preposição. É o que acontece na equívoca formação "ante ao", que pode sem assim desdobrada: "[ante + (a + o)]".

Dessa forma, não se pode construir no texto jurídico - sobretudo, em uma prova dissertativa de concurso público - a estrutura frasal "Ante ao exposto, julgo procedente o pedido", devendo-se substituí-la por formas mais recomendadas, a saber:

- Ante o exposto, julgo procedente o pedido. Ou, ainda:

- Em face do exposto, julgo procedente o pedido.

- Do exposto, julgo procedente o pedido.

Em mais uma oportunidade, a Banca deu indicações de que recomenda o bom uso do português em suas provas. Na questão 39, o período "Ante a situação hipotética descrita e considerando as regras (...), é correto afirmar que (...)" ratifica a orientação. Escreveu-se ante a situação (sem crase), e não "ante à situação", que poderia evidenciar o equívoco da duplicidade de preposições "[ante + (a + a)]". Não foi o que a Banca quis, nem, aliás, o que quer ou quererá. Cuidado!


Assim, as dicas em epígrafe poderão ser úteis àqueles que lograram a aprovação na primeira fase, devendo enfrentar a segunda etapa em breve.


Sempre procuro enfatizar que a aferição do conhecimento jurídico pela Banca em uma prova dissertativa de concurso só será possível se o candidato souber demonstrá-lo no texto, valendo-se inexoravelmente de um bom português. Não há boa segunda fase sem este...

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