NOVA RECOMENDAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

O Diário Oficial do Estado, edição nº 12.515, publicou hoje uma nova recomendação do Ministério Público. Leia-a abaixo, na íntegra:


MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE JARDIM DE PIRANHAS/RN


RECOMENDAÇÃO n° 16/2011


O MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE, através da Promotoria de Justiça da Comarca de Jardim de Piranhas/RN, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo no artigo 129, inciso II, da Constituição Federal, artigo 84, inciso II, da Constituição do Estado do Rio Grande do Norte e no artigo 61, inciso I, da Lei Complementar Estadual nº 141/96, e

Considerando que incumbe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses transindividuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos de relevância social, sendo sua função institucional zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos aos direitos assegurados na Constituição Federal, promovendo as medidas necessárias para a sua garantia, conforme dispõe os artigos 127, caput, e 129, inciso III, da nossa Carta Magna e os artigos 83, caput, e 84, inciso II, da Constituição do Estado do Rio Grande do Norte;

Considerando que o art. 129, III, da Constituição Federal informa ser função institucional do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos ;

Considerando que tramita nesta Promotoria de Justiça o inquérito civil nº 012/2009, instaurado em razão de representação do Tribunal de Contas do Estado, a qual dá conta de irregularidades na situação funcional dos servidores da Câmara de Vereadores de Jardim de Piranhas;

Considerando que a documentação que instrui o citado procedimento demonstra que no quadro de servidores da Câmara de Vereadores de Jardim de Piranhas existem 20 (vinte) servidores ocupando (exclusivamente) cargo comissionado, em detrimento de 01 (um) cargo efetivo;

Considerando a inexistência de lei que crie, estabeleça as funções e fixe vencimentos dos cargos do Legislativo do Município de Jardim de Piranhas;

Considerando que já foi tentada a regularização da situação funcional dos servidores do Legislativo local mediante proposta de assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta, cuja minuta foi elabora pelo membro do Parquet e encaminhada ao Presidente da Casa Legislativa;

Considerando que o Presidente da Câmara de Vereadores informou, em ofício encaminhado a esta Promotoria em 13/10/2010, não ter atribuição para firmar o referido TAC, em razão da matéria competir à Mesa Diretora daquela Casa, e não ao Presidente isoladamente, oportunidade em que também comunicou que a minuta seria encaminhada à Mesa Diretora para análise de pertinência;

Considerando novas informações prestadas pelo Chefe do Executivo em 20/07/2011, no sentido de “ter se tornado juridicamente inviável a proposição de Projeto de Lei com vistas à criação de cargos e fixação de salários dos servidores pelo fato de não ser tal instrumento legislativo a forma de administração do quadro funcional do Legislativo.”

Considerando, ainda segundo os informes do Presidente da Câmara que, “nos termos do Art. 26, inciso II da Lei Orgânica do Município e Regimento Interno da Câmara, compete a Mesa Diretora estabelecer seu quadro de servidores mediante Resolução por tratar-se de Colegiado reservando-se ao Poder Executivo a prerrogativa de dispor sobre seus servidores mediante Projeto de Lei pelo que a utilização de instrumento legal diverso daquele estabelecido na Lei Orgânica tornaria nulo o ato administrativo decorrente do mesmo prejudicando a instituição e seus servidores.”

Considerando o disposto na Resolução nº 001/2009, aprovada e promulgada pela Câmara de Vereadores de Jardim de Piranhas em março de 2009, a qual instituiu a reforma administrativa e nova estrutura funcional daquela Casa, criando e extinguindo cargos e estabelecendo suas atribuições e competências;

Considerando que todos os cargos criados e/ou regulamentados por tal Resolução são de provimento em comissão, o que contraria, frontalmente, o disposto no art. 37, V, da Constituição da República, que diz, textualmente: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;”

Considerando que a Resolução nº 001/2009, única norma a regulamentar os cargos do legislativo municipal, além de criá-los, também fixou-lhes a remuneração;

Considerando que o inciso X, do citado artigo 37 da Carta Magna, também está a exigir lei formal para a fixação da remuneração dos cargos públicos, verbis: “a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;”

Considerando que a Resolução nº 001/2009 da Câmara de Vereadores de Jardim de Piranhas não tem eficácia para sustentar a nomeação de qualquer dos ocupantes dos cargos criados, já que “cargo” sem “remuneração” fixada em lei formal não pode ser preenchido. A uma, por causa do princípio da legalidade da despesa. A duas, porque ninguém pode desempenhar cargo público comissionado sem remuneração, e a aludida Resolução jamais poderia ter fixado a remuneração para os cargos criados, matéria privativa de lei em sentido formal, por expressa disposição da Lei Maior;

Considerando que estas normas constitucionais são de observância obrigatória pelo legislativo municipal, sendo condicionantes para a validade e até mesmo para a eficácia das deliberações na esfera municipalista.

Considerando que contrariada frontalmente a Constituição da República não é mais possível extrair eficácia de norma infraconstitucional promulgada ao seu arrepio.

Considerando que ainda que se invoque a regularidade da criação de cargos no legislativo municipal através de Resolução ou outro diploma normativo (por simetria ao que ocorre com a Câmara dos Deputados e o Senado Federal - respectivamente, art. 51, IV e 52, XIII da CR/88), é preciso deixar bem entendido que a Constituição, em qualquer caso, exigiu a existência de lei formal para a fixação da respectiva remuneração, mesmo para a Câmara dos Deputados e o Senado Federal.

Considerando, a esse respeito, ser oportuno registrar que a organização básica do serviço público se faz, essencialmente, por lei. Conforme nos ensina o insuperável Hely Lopes Meirelles, no clássico Direito Administrativo Brasileiro, da Editora Malheiros, a Constituição, ao permitir a acessibilidade dos cargos públicos a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, quer dizer que todo cargo público só pode ser criado e modificado por norma legal aprovada pelo Legislativo;

Considerando, por outro lado, que a criação de cargos, por lei, não pode ser vista em bloco nos Poderes dos diversos níveis de governo, haja vista os enunciados de alguns dispositivos constitucionais que tratam da matéria, como nos ensinam outros administrativistas como Diogenes Gasparini e Celso Antônio Bandeira de Mello, especificamente aqueles concernentes aos serviços auxiliares do Legislativo, caso em que se criam os respectivos cargos por resolução, na inteligência do disposto nos incisos IV do art. 51 e XIII do art. 52 da Lei Maior da República, porquanto se referem à competência privativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal;

Considerando que, desse modo, poder-se-ia, num primeiro momento, admitir que a Resolução nº 001/2009 da Câmara Municipal de Vereadores de Jardim de Piranhas fosse instrumento normativo hábil para criar os cargos públicos. Ocorre, porém, que a Lei Orgânica do Município de Jardim de Piranhas não tratou tal atribuição como competência privativa da Câmara de Vereadores, pelo contrário, impôs, consoante se comprova no inciso XI do art. 16, a participação do Chefe do Poder Executivo no processo de criação dos cargos públicos, in verbis: ‘Art. 16 — Compete à Câmara Municipal, com a sanção do Prefeito, legislar sobre as matérias de competência do Município, especialmente no que se refere a: (…) XI — criação, alteração e extinção de cargos e funções públicas e a fixação da respectiva remuneração;

Considerando que é a própria Lei Orgânica (que deveria ser conhecida integralmente pelo Legislativo, uma vez ter sido por ele elaborada), portanto, lei formal e material de cuja feitura não participa o Executivo, nos termos do que dispõe o caput do art. 29 da Constituição Federal, que exige a criação dos cargos mediante lei, pelo que não se poderia fazê-lo por intermédio da Resolução;

Considerando, entretanto, que o art. 26, II, destinado apenas aos servidores do Poder Legislativo, preceitua, nos termos do parágrafo único, que “Compete à Mesa Diretora da Câmara Municipal propor ao plenário projetos de resolução sobre a organização dos serviços administrativos da Câmara Municipal, criação, transformação e extinção de cargos ou funções da Câmara, bem como a fixação da respectiva remuneração observadas as determinações legais”;

Considerando assim, que constata-se haver conflito de normas entre as disposições constantes na própria Lei Orgânica do Município de Jardim de Piranhas quanto ao diploma jurídico apto a disciplinar a criação dos cargos do Poder Legislativo, em que pese a maioria de seus dispositivos indicar a lei como espécie mais adequada.

Considerando que a dissonância dos conteúdos normativos aqui colacionados necessita ser ponderada para não macular os cargos públicos (a serem regularmente criados) da Câmara Municipal, sendo certo que, se por um lado, a Constituição Federal permite a regulamentação da matéria por meio de resolução, consoante a competência privativa lançada nos arts. 51 e 52, não é menos certo que o legislador local optou pela adoção da lei quando disciplinou, na Lei Orgânica, as competências e atribuições do próprio Poder Legislativo.

Considerando, nessa linha, ser pertinente a transcrição do antigo provérbio que acabou sendo considerado verdadeira máxima do Direito segundo o qual “quem pode o mais, pode o menos” para ressaltar que é perfeitamente possível regular, por lei, matéria que seja de alçada da resolução, tendo em vista ser aquela norma de hierarquia superior;

Considerando que a recíproca não é verdadeira, ou seja, aquilo que deve ser normatizado por lei não pode ser disciplinado por resolução. Dessa feita, considerando que os cargos hoje existentes na Câmara de Vereadores foram criados por resolução, pairando, assim, dúvida, quanto à sua legalidade e certeza de ilegalidade no que pertine à fixação de suas remunerações, matéria reservada à lei;

Considerando, como informado pelo Presidente da Câmara, não ser interesse do legislativo mirim prejudicar a instituição e seus servidores;

Considerando, finalmente, que a criação de cargos de livre nomeação e exoneração não pode se tornar regra, com excesso de tais cargos, sob pena de se burlar a exigência constitucional de prévio concurso para ingresso no serviço público e de incidir, o responsável, em violação aos princípios constitucionais, especialmente os da legalidade e moralidade administrativa, cuja infrigência importa no cometimento de improbidade administrativa.

RESOLVE:

RECOMENDAR ao Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Jardim de Piranhas, Sr. LUÍS SOARES DE ARAUJO:

1) Que, em atenção aos dispositivos constitucionais e à Lei Orgânica do Município acima invocados, apresente Projeto de Lei (providenciado a célere tramitação a fim de que seja votado no prazo de sessenta dias), com vistas à regulamentação do quadro de servidores da Câmara Municipal;

2) Em tal Projeto, obviamente, deverão ser respeitadas as exigências do Art. 37, V, da CF, devendo conter previsão de que possíveis funções de confiança sejam exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão serão preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinando-se apenas às atribuições de direção chefia e assessoramento.

3) Que, no prazo supra indicado, também providencie a modificação da legislação (adequando-a ao item 2 - acima) já existente e que afronta as normas legais mencionadas na presente Recomendação;

O não atendimento desta recomendação importará na adoção das medidas judiciais cabíveis, tanto para cessação de ilegalidade, quanto para punição dos responsáveis. Encaminhe-se a presente Recomendação para que seja publicada no Diário Oficial do Estado, bem como se remetam cópias ao Centro de Apoio Operacional respectivo, ao destinatário e ao Prefeito Constitucional para ciência.

Fica o destinatário desta recomendação desde já notificado a informar, dentro do prazo de 15 (quinze) dias, a respeito das providências iniciais adotadas com vistas ao seu cumprimento, encaminhando, inclusive, documento comprobatório de que os demais membros do Legislativo, sobretudo os integrantes da Mesa Diretora, foram cientificados da Presente Recomendação.

Jardim de Piranhas/RN, 1º de agosto de 2011.

Paulo Carvalho Ribeiro
Promotor de Justiça Substituto em substituição

4 comentários:

Anônimo disse...

E QUANTO AO CONCURSO PÚBLICO DA PREFEITURA DE JARDIM DE PIRANHAS?A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR:VAI FICAR POR ISSO MESMO?CADE O SENHOR PROMOTOR?NÃO VAI TOMAR AS PROVIDÊNCIAS?NÃO ESTAMOS NA ITALIA,MAS SERÁ QUE VAI ACABAR TUDO EM PIZZA!!!

Anônimo disse...

Só espero que no "futuro concurso" para servidores da Câmara Municipal, não venha a acontecer o que ocorreu com o da Prefeitura Municipal. Responsabilidade e Ética são fundamentais aos três poderes.

Anônimo disse...

Alcimar, respondendo ao Anônimo... CIDADÃO, O CONCURSO FOI ANULADO.
Descarte qualquer esperança de, nesta gestão, haver novo certame.
Quem tem que tomar as providências é o Prefeito. o MP fez a parte dele, anulou a uma fraude. Continue fazendo a sua parte, reclame e se indigne diante dessas situações.

Anônimo disse...

20 cargos de confiança? É muita pretenção, tem que lembrar os contratos dos carros que nunca fez nenhuma viagem, isto é coisa muito grave.

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