A matéria de capa da revista Veja desta semana, edição nº 2.217, intitulada “Uma geração descobre o prazer de ler”, versa sobre a importância da leitura. Em dez páginas, o jornalista Bruno Meier enfoca todos os benefícios advindos do contato habitual com os livros. Leia, abaixo, os trechos que considerei mais importantes:
(...) Ler é prazer. E, uma vez que se prova desse deleite, ele é mais e mais desejado. Basta um pequeno empurrãozinho (...)
Várias vezes, no decorrer do último século, previu-se a morte dos livros e do hábito de ler. O avanço do cinema, da televisão, dos videogames, da internet, tudo isso iria tornar a leitura obsoleta. No Brasil da virada do século XX para o XXI, o vaticínio até parecia razoável: o sistema de ensino em franco declínio e sua tradição de fracasso na missão de formar leitores, o pouco apreço dado à instrução como valor social fundamental e até dados muito práticos, como a falta e a pobreza de bibliotecas públicas e o alto preço dos exemplares impressos aqui, conspiravam (conspiram ainda) para que o contingente de brasileiros dados aos livros minguasse de maneira irremediável. Contra todas as expectativas, porém, vem surgindo uma nova e robusta geração de leitores no país – movida, sim, por sucessos globais como as séries “Harry Potter”, “Crepúsculo” e “Percy Jackson” (...).
É mais fácil tornar a leitura um hábito, claro, quando ela se inicia na infância. Mas qualquer idade é boa, é favorável, para adquirir esse gosto. Basta sentir aquela comichão do prazer, e da curiosidade – e então fazer um esforço, bem pequeno, para não se acomodar a uma zona de conforto, mas seguir adiante e evoluir na leitura.
(...) “Não gosto de Machado de Assis até hoje porque lembro que fui obrigado a lê-lo no colégio quando ainda não estava preparado”, diz o administrador paulista Eduardo Ribeiro. Machado de Assis é frequentemente um dos primeiros autores a ser indicados como leitura obrigatória em sala de aula – e tem se tornado um pesadelo para qualquer docente que deseja transformar a leitura em fruição e não em aversão. “Exigir a leitura de ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas’ e marcar uma prova semanas depois definitivamente não é o caminho”, diz a pedagoga Elizabeth Baldi, fundadora da Escola Projeto, em Porto Alegre.
(...) Um estudo divulgado no mês passado pela Universidade Oxford demonstra uma conexão inequívoca entre leitura e sucesso profissional. Conduzida pelo americano Mark Taylor, do departamento de sociologia, a pesquisa ouviu 17.200 pessoas nascidas em 1970. Comparou as atividades extracurriculares desenvolvidas por elas quando tinham 16 anos com a sua posição hierárquica aos 33. A leitura se revelou o único fator que, de forma consistente, esteve associado à ascensão profissional. Para as mulheres, a chance de ter um cargo mais elevado cresce de 25% para 39% quando leem; para os homens, de 48% para 58%. Nenhuma outra atividade – cinema, esportes, visitas a museus e galerias – teve impacto significativo. O progresso pode estar associado ao desenvolvimento do vocabulário e ao domínio de conceitos abstratos propiciados pelo hábito da leitura. E vale enfatizar: a pesquisa centrou-se na leitura extracurricular. Ou seja, o livro lido por prazer – e não porque foi exigido em uma disciplina escolar – é o que realmente conta.
Para quem não tem o hábito da leitura (e, entre os brasileiros, muitos não o têm), o projeto de se tornar um leitor sofisticado pode parecer inatingível – e tedioso, e cansativo. (Inútil não o é MESMO, como está demonstrado no parágrafo acima.) Mas imagine se, dez anos atrás, alguém pedisse a você que tomasse decisões com a carga de responsabilidade das que toma hoje, ou que manejasse os programas de computador que hoje lhe são habituais: impossível, assustador. Com a leitura, dá-se esse mesmo processo de aprendizado, cumulativo e, por que não, suave.
(...)
Ler é indispensável para aqueles que querem se expressar bem: mostra as diversas possibilidades da língua, aumenta o vocabulário e enriquece o conhecimento. “É a forma mais eficiente de saber e de humanizar-se, colocando-se no papel do outro. Deixa a pessoa mais próxima da civilização e mais distante da barbárie”, diz o escritor Miguel Sanches Neto, exemplo de cidadão que, mesmo num ambiente de pobreza material e cultural, buscou o melhor da literatura. Todas essas benesses, porém, só são adquiridas quando o leitor passa a buscar uma leitura mais seletiva e procura o melhor que os autores clássicos e célebres já produziram ao longo do tempo. “Existem livros que tratam a pessoa como consumidora e acompanhante passiva da história. Esses dispensam a atividade do leitor”, diz Luís Augusto Fischer, professor de literatura brasileira brasileira na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e autor de ‘Filosofia Mínima – Ler, Escrever, Ensinar, Aprender’. E aí se chega a uma recomendação importante: nos primeiros meses, não importa muito o que a pessoa lê, desde que ela adquira a habilidade essencial de ler apenas por prazer. Tom Wolfe, uma dos mais celebrados jornalistas e escritores americanos, leu apenas e tão somente sobre beisebol até os 16 anos de idade – mas leu.
(...)
Cena verídica observada em um dos mais caros shopping centers paulistanos: uma mãe passeia pelos corredores com seus dois filhos, de uns 5 e 8 anos, quando o mais velho exclama, entusiasmado: “Olha, uma livraria! Vamos lá, mamãe?”. Ao que ela repreende, seguindo na direção contrária: “Livraria? E o que é que você quer fazer lá?”. Ora, mamãe, por favor. Da próxima vez, deixe que seu filho a puxe pela mão e se perca entre as estantes. E aproveite para fazer o mesmo. Você vai se surpreender com o que encontrará lá – e consigo mesma.
Após ler essa matéria, lembrei-me de que, quando criança, sentava-me na calçada de casa, debaixo de uma algaroba, onde passava horas lendo revistas em quadrinhos. Muitas pessoas passavam pela rua e me “aconselhavam” a largar tudo aquilo, alertando-me para o risco que corria de ficar louco.
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