A Região do Seridó, sem nenhum traço de
bairrismo, reúne população ímpar em todo o território nacional. Somente quem
nos conhece de perto percebe o quão somos solidários, festivos, ordeiros e
tementes a Deus. Ainda que enfrente, com garbo e perseverança, as secas que
assolam a região, o seridoense, em nenhum momento, deixa-se abater. É, na
atualidade, o maior exemplo do sertanejo descrito por Euclides da Cunha em Os Sertões.
Esta querida terra foi, ao longo dos tempos,
ocupada por famílias oriundas de outras regiões, tão logo o lugar viu-se livre
dos indígenas que aqui viviam, dizimados que foram na chamada Guerra dos Bárbaros. Câmara Cascudo[1]
assim registrou o início da ocupação:
O século XVIII é a
conquista do Seridó. Começa uma história sem possibilidades documentais. Mais story que history. É a odisseia dos posseiros, homens sem títulos
legitimadores da estabilidade. Vinham do Ceará, da Paraíba, acompanhando os
rios orientadores, Piancó, Rio do Peixe, Pinharas, fundidos no Piranhas,
tornado Rio do Açu, caindo no Atlântico em Macau.
Os posseiros bateram
primeiro nas várzeas e planalto do Apodi, tabuleiros e capoeirões do Seridó,
batizando a terra nullius domini sem
que deixassem pegada em livro da Real Fazenda e sim nos acidentes da serra,
carrasco e caatinga, padrinhos dos riachos, serrotas e logradouros.
O século XVIII fora
a centúria do povoamento efetivo dos sertões e agreste, em ambas as dimensões
territoriais: do norte para o Ceará; do sul para a Paraíba, avivado pela osmose
do Jaguaribe e do Piranhas.
O impulso era a
pastorícia, profetizada por Diogo de Campos em 1614: “A terra lhe franca mais
para o gado e creações do que para canaviares e roças.” As roças vieram,
suficientes e fartas, mas apoiando a família dos vaqueiros na labuta do campo.
A data – 480, da
segunda metade do séc. XVIII, de Estevão Ribeiro Leitão na Ribeira do Seridó é
um quadro inesquecível. “Entre as serras que se acham entre os sítios do Patacoró
pelo nascente, Jucurutu pelo poente, e Salgado pelo sul, e a Garganta pelo
norte, entre as quais serras não há saída senão por um boqueirão que fica para
a parte do Cais (era o nome de uma propriedade). Principia a medição de um olho
d’água chamado pelo gentio “Pega-Aradiró”, ficando de dentro dois olhos d’água
mais, chamados Pacanharé e Quinquê, tudo dentro das mesmas serras.” O documento
denuncia a presença dos Pegas Cariris, fugidos da Paraíba ou habituados à
região do nomadismo cíclico, indo e vindo. Davam nome a um olho d’água.
A história da
fixação econômica no território de cada comunidade norte-riograndense tem o
capítulo basilar no território onde o povoamento se iniciou nos séculos XVIII e
XIX. Foram povoações, alguns já distritos com a dignidade de vila, mas o
passado se explica na continuação do trabalho coletivo no arruado de origem. Haviam
nascido de sítios agrícolas ou de fazendas de pastorícia. O povoamento decorre
da criação de gado com a presença dos sesmeiros autorizados e dos posseiros
anteriores, sem título de domínio mas com notória atuação produtiva. Não tivemos
o lavrador no trabalho exclusivo do campo, plantando, colhendo, enceleirando. A
lavoura era de apoio, garantindo a subsistência familiar.
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